Justiça
18h20 19 Dezembro 2025
Atualizada em 19/12/2025 às 18h20

Operação 'Cacique do Asfalto': promotores miram grupo que 'esquentava' reboques de carros

Por Fausto Macedo e Felipe de Paula Fonte: Estadão Conteúdo

O Ministério Público de São Paulo e a Polícia Civil deflagraram nesta sexta-feira, 19, a Operação 'Cacique do Asfalto' para desarticular um esquema de emissão de documentos falsos para reboques com registro de roubo, furto ou pendências civis - prática que permitia a recolocação das peças no mercado como se fossem recém-fabricadas.

Os alvos da investigação são duas empresas, o suposto líder do esquema, seus dois filhos e um 'laranja', todos suspeitos de receptação, adulteração de sinais identificadores de veículos automotores, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro e organização criminosa. O bloqueio de bens determinado pela Justiça com base em representação dos promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) alcança R$ 5,8 milhões.

Segundo os promotores, a empresa Rodotec Indústria, Comércio e Prestação de Serviços Rodoviários Ltda., localizada em Itapecerica da Serra (Grande São Paulo), recebia diretamente da Secretaria Nacional de Trânsito a numeração de chassis para a fabricação de veículos próprios.

Os dados eram registrados na Base Índice Nacional do Renavam, com todas as informações do veículo produzido, e posteriormente direcionados ao banco de dados do Detran no primeiro emplacamento.

A reportagem do Estadão busca contato com a Rodotec. O espaço está aberto.

Segundo o Gaeco, a documentação era usada para "esquentar" os produtos, conferindo aparência de legalidade aos equipamentos que chegavam à empresa pela via da receptação.

"A referida empresa se vale de sua condição de fabricante de veículos para simular a venda de reboques e semirreboques não fabricados por ela, que possuem registro de roubo, furto ou restrição judicial, com a finalidade de dar aparente legalidade aos bens, mediante e emissão de notas fiscais 'frias', referentes à venda de veículos novos que, na verdade, são não apenas usados, mas de proveniência ilícita', atesta o MP.

Segundo a investigação, filiais da Rodotec apresentaram movimentações financeiras atípicas identificadas em Relatórios de Inteligência Financeira. "Entre 1.º de novembro de 2019 e 3 de janeiro de 2020, a Rodotec Importação e Exportação de Equipamentos Agrícolas e Rodoviários movimentou R$ 38,55 milhões em créditos e R$ 38,56 milhões em débitos em uma única conta", diz o documento.

'Fabricação própria de outras empresas'

O esquema começou a ser desvendado a partir de indícios reunidos em cinco estados, durante abordagens da Polícia Rodoviária Federal, que identificou reboques e semirreboques registrados como "fabricação própria de outras empresas", embora apresentassem sinais evidentes de uso e identificadores que sinalizavam a produção por outros fabricantes.

Segundo os promotores Juliano Carvalho Atoji, Carlos Bruno Gaya da Costa, Danilo Orlando Pugliesi e Eduardo Augusto Velloso Roos Neto, "os chassis de veículos de origem ilícita eram suprimidos, assim como outros elementos identificadores, com o objetivo de dificultar ou até inviabilizar a identificação do veículo original."

Velhos conhecidos

No curso das investigações, o Gaeco identificou que a Rodotec era comandada por Juscelino Matos de Oliveira, citado pela Polícia Civil em investigações sobre receptação e pela Polícia Federal por associação ao tráfico de entorpecentes.

O filho dele, Felipe Matos de Oliveira, também foi investigado no mesmo inquérito da PF que atingiu o pai, apontado como líder do suposto esquema de reboques fraudulentos.

Já o contador da empresa, Marcelo Antônio Rosa, que não foi alvo das diligências desta sexta-feira, respondeu a inquérito da Delegacia de Roubos a Bancos da Polícia Civil de São Paulo em 1998, por suspeitas de receptação e estelionato.

As investigações também identificaram a existência de diversas empresas ligadas ao grupo Rodotec, com indícios do uso de 'laranjas' para ocultar a participação de Juscelino Matos de Oliveira nas sociedades.

Uma dessas interpostas pessoas seria Débora Torres de Oliveira - alvo do Gaeco nesta sexta e funcionária da Rodotec, onde atuava como supervisora administrativa, com salário contratual de R$ 4.500.

Em fevereiro de 2022, Débora substituiu Érica Matos de Oliveira, filha de Juscelino, no quadro societário da Rodoaxle Soluções para Implementos Rodoviários. Érica também foi alvo de busca e apreensão na manhã desta sexta.

A 'laranja' Débora também figura como sócia de quatro empresas, inclusive de pneus e importação e exportação.

A reportagem busca contato com a defesa dos citados. O espaço está aberto.

"Sob a perspectiva dos fatos expostos, todos os indícios apontam para a existência de atividade criminosa por trás da empresa Rodotec, seus sócios, pessoas interpostas e filiais, em suma, pela prática de crimes tributários, de receptação, adulteração de sinais identificadores de veículos automotores, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, todos no contexto da organização criminosa por eles integrada", conclui o Gaeco.

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