O Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) propôs alterar o padrão de alavancagem suplementar (eSLR, em inglês) e os requisitos de capital para bancos sistematicamente importantes, conhecidos como GSIBs. O BC dos Estados Unidos divulgou nesta quarta-feira, 25, um rascunho da proposta e uma atualização sugerida para o Federal Register (o Diário Oficial dos EUA), emitida em conjunto com a Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC) e o Escritório de Controle Cambial.
Os documentos sugerem reduzir os requisitos de capital agregado de nível 1 para os GSIBs em 1,4% e em 27% para instituições depositárias subsidiárias de bancos globais.
Segundo o Fed, contudo, os bancos ainda teriam que cumprir os requisitos mínimos das regras de capital bancário para administrar adequadamente os riscos aos quais estiverem expostos, o que impediria o repasse de capital para acionistas e investidores.
Especificamente, cada GSIB e suas subsidiárias terão que manter uma taxa de alavancagem suplementar de pelo menos 3% e um buffer adicional de 2% para evitar limitações de distribuição de capital.
O cálculo levará em conta uma recalibração da eSLR para se igualar a 50% do método de nível 1 da estrutura de cobrança baseada em riscos do Fed.
A proposta ficará aberta para comentário público por 60 dias.
Defesa de Powell
O presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, defendeu nesta quarta-feira a proposta da instituição dos Estados Unidos. Durante reunião pública do Fed, Powell afirmou que a regra, originalmente criada após a crise financeira global de 2008, precisa ser atualizada para refletir as mudanças estruturais no sistema financeiro norte-americano.
"Mais de uma década atrás, após a crise financeira global, as agências adotaram a razão de alavancagem suplementar como um requisito de capital que serviria de retaguarda às exigências baseadas em risco", afirmou o líder do Fed.
Segundo ele, a medida foi "um passo importante para garantir a resiliência do sistema bancário".
Powell explicou, no entanto, que as condições desde então mudaram. Quando a diretoria do Fed aprovou o eSLR, esperava-se que as reservas bancárias diminuíssem nos anos seguintes. "Em vez disso, vimos as reservas bancárias aumentarem substancialmente", afirmou.
Ele também destacou a forte alta das participações em títulos do Tesouro nos balanços dos bancos. Esse acúmulo de ativos "relativamente seguros e de baixo risco" fez com que a exigência de alavancagem se tornasse mais restritiva do que o previsto.
"Com base nessa experiência, é prudente reconsiderar nossa abordagem original", disse Powell. Segundo ele, o objetivo é garantir que a exigência de capital não desestimule a atuação dos bancos em atividades de baixo risco, como a intermediação no mercado de Treasuries. "Queremos garantir que a razão de alavancagem não se torne regularmente vinculante e desestimule os bancos de participar dessas atividades."
Powell ressaltou que a proposta, fruto de trabalho conjunto entre agências reguladores, visa ajustar a calibragem da exigência "sem comprometer a resiliência do sistema" e está "alinhada com o arcabouço do Comitê de Basileia".
Divisão entre diretores
O diretor do Fed Michael Barr criticou a proposta, afirmando que ela "reduz desnecessária e significativamente o capital bancário em US$ 210 bilhões para os bancos globalmente sistêmicos (GSIBs)" e "enfraquece a eSLR como uma rede de proteção".
Segundo Barr, a medida aumenta o risco de colapso de grandes bancos e pode comprometer a capacidade de resolução ordenada em caso de crise. "Tomadas em conjunto, essas mudanças aumentariam significativamente o risco de falência de um GSIB", alertou.
O dirigente argumentou que a proposta não garante melhora na intermediação do mercado de Treasuries. "As firmas poderiam simplesmente direcionar o capital liberado para outras atividades com requisitos de capital mais baixos e retornos mais altos", disse. Segundo ele, mesmo se houvesse maior atuação em tempos normais, "não haveria capital excedente em tempos de estresse".
Barr também criticou a opacidade que a proposta traria. "A proposta desgasta a transparência da rede de proteção de capital", afirmou.
Ele ainda rejeitou a ideia de excluir Treasuries e ativos do Fed da base da eSLR. "Pode parecer atraente, mas é uma ladeira escorregadia", alertou. Ainda que contrário à proposta atual, ele sinalizou abertura a um ajuste "muito mais modesto".
O diretor do Fed Christopher Waller, por sua vez, apoiou a proposta do BC dos EUA, em declaração preparada para reunião do Conselho do Fed nesta quarta-feira. Segundo ele, a defesa pela mudança é para que a medida sirva como um "reforço aos requisitos baseados em risco".
"Acredito que a abordagem proposta para simplesmente reduzir o grau de vinculação da eSLR é preferível à exclusão explícita de ativos específicos, como passivos do governo. Não é nossa função escolher vencedores e perdedores. A abordagem proposta deixará essas escolhas e a gestão de risco para os bancos, o que é apropriado", ponderou no texto.
Em contrapartida, a diretora do Fed Adriana Kugler afirmou que não pode apoiar a proposta por considerar que a redução de capital para subsidiárias bancárias de grandes bancos eleva o risco sistêmico. Também em discurso preparado para reunião do Fed, ela disse que a proposta tenta resolver um possível efeito colateral do modelo atual, mas "vai além do necessário".
Segundo Kugler, a regra de capital mínimo pode estar desincentivando atividades de menor risco, como a intermediação de Treasuries, e por isso ela "teria se inclinado a apoiar" mudanças limitadas ao cálculo da eSLR para as holdings dos bancos sistêmicos globais (G-SIBs). No entanto, rejeitou o escopo atual do plano, que inclui cortes de 27% nos requisitos de capital de nível 1 para subsidiárias bancárias. "Não estou convencida de que os benefícios à intermediação de Treasuries justifiquem essas reduções significativas", afirmou.
A dirigente alertou que, ao deixar o capital concentrado em outras partes do conglomerado financeiro, "não há garantia de que ele será realocado para o banco quando necessário para conter uma corrida bancária".
Ela concluiu pontuando que acredita " que essa redução aumentará o risco sistêmico de forma injustificável".
Kugler defendeu uma abordagem mais ampla e integrada da regulação de capital.
Defesa de Michelle Bowman
A vice-presidente de Supervisão do Conselho do Federal Reserve, Michelle Bowman, afirmou que a proposta do BC norte-americano ajudará a construir resiliência nos mercados de Tesouro dos EUA, em declaração preparada para a reunião nesta quarta-feira.
Segundo ela, a medida também pode reduzir a probabilidade de disfunção do mercado e a necessidade de o Fed intervir em um futuro evento de estresse. "Devemos ser proativos em abordar as consequências não intencionais da regulamentação bancária, incluindo a vinculação da eSLR, enquanto garantimos que o quadro continue a promover segurança, solidez e estabilidade financeira", menciona.
Para Bowman, a proposta também é um passo importante para "equilibrar a estabilidade do sistema financeiro", preservando a segurança e a solidez, bem como restaurando o eSLR como um mecanismo de proteção.