Futebol
14h50 21 Agosto 2025
Atualizada em 21/08/2025 às 14h50

Dilemas do padrão Fifa no Brasil desafiam Santos e Portuguesa na busca por arenas sustentáveis

Por Leonardo Catto Fonte: Estadão Conteúdo

Existe um antes e um depois da Copa do Mundo de 2014 para os estádios brasileiros. O País seguiu uma tendência de transformação dos locais em arenas, adequando-se ao chamado "padrão Fifa". Agora, o Santos terá a mudança na Vila Belmiro a partir de uma parceria com a WTorre. Já a Portuguesa trabalha com a Revee no mesmo sentido.

O projeto da nova arena santista prevê um investimento de cerca de R$ 700 milhões, o que inclui contrapartidas do clube e da construtora ao município de Santos. São obras de infraestrutura no entorno do estádio, como revitalização de vias, instalação de câmeras de segurança e melhorias na sinalização de trânsito.

A nova arena deve receber shows e eventos, além dos jogos. A previsão é de três anos de obras até a conclusão do estádio, que passará a ter 30 mil lugares, pouco menos de 10 mil a mais do que a lotação atual.

"Está sendo destacada a nossa história, nossa tradição e valorizando a Vila Belmiro, que já teve diversas fases, entre elas, nossa arquibancada de madeira. Era imprescindível melhorar e modernizar o estádio. É um passo fundamental", defende o presidente santista, Marcelo Teixeira.

Coincidentemente, o custo de R$ 700 milhões se aplica também ao projeto da Portuguesa, em parceria com a Revee, para a transformação do Estádio do Canindé em uma arena. A proposta prevê um estádio com capacidade para 46.500 torcedores e até 84.500 espectadores para shows. A expectativa é de início das obras em janeiro de 2026, com duração de até 40 meses (três anos e quatro meses)

"Estamos entregando um projeto de estádio moderno, capaz de receber não apenas os jogos da Portuguesa, mas também grandes eventos. É um ganho para o clube e para toda a cidade de São Paulo", afirma Alex Bourgeois, CEO da SAF da Portuguesa.

COM GRANDES ARENAS, NEM SEMPRE VÊM GRANDES PÚBLICOS

As arenas brasileiras vivem hoje um desequilíbrio de públicos entre diferentes locais, mesmo com a quantidade de jogos semelhantes. Das 12 sedes da Copa do Mundo de 2014, por exemplo, a Neo Química Arena tem a melhor média, com 42.036 pessoas por jogo.

Foram 25 partidas no ano até 17 de agosto, e apenas uma não teve o Corinthians como mandante (o amistoso feminino Brasil 3 x 1 Japão). A média representa 87% da capacidade máxima da arena (48.234). O recorde do estádio corintiano no ano foi 48.169 pessoas em Corinthians 2x1 Santos pelo Paulistão.

Por outro lado, o Corinthians ostenta uma dívida de R$ 668 milhões referente ao financiamento da construção junto à Caixa Econômica Federal. Isso representa 26,72% do total do passivo (R$ 2,5 bilhões).

Já a Arena Pantanal tem a menor média de público entre os 12, com 1.408, o que representa 3,1% da capacidade total (44.097). Foram 19 jogos em 2025: 15 com o Cuiabá como mandante, um do Ação (Brasileirão Feminino A2), um do Dom Bosco (Mato-grossense), um do Operário de Várzea Grande (Mato-grossense) e um do Mixto (Mato-grossense).

Com público menor, até pelas diferentes competições nas quais Corinthians e Cuiabá atuam, a Arena Pantanal faz valer o termo "multiuso". Lá operam a Escola Arena, para alunos a partir do 7º ano do Ensino Fundamental, com disciplinas convencionais e vocacionadas ao esporte e uma unidade da Secretaria de Estado de Cultura, Esporte e Lazer.

Segundo informado pelo governo do Estado do Mato Grosso, que administra o estádio, o custo anual da operação é de aproximadamente R$ 15 milhões. A cada evento realizado no espaço, há um faturamento de 8% da renda bruta, por meio de Documento de Arrecadação (DAR) do Estado.

Pode haver, contudo, isenção total ou parcial. É o caso do Cuiabá, que "contribui com melhorias no estádio, como a manutenção do gramado, entre outros serviços".

PALMEIRAS E FLAMENGO SÃO EXEMPLOS PARA FAZER CASA CHEIA

O Allianz Parque não foi sede da Copa do Mundo em 2014, mas seguiu a tendência de arenas no Brasil, tendo a inauguração no mesmo ano. Assim como a Neo Química Arena, o estádio palmeirense mantém bons números de público.

Somente com repasses da WTorre por shows, eventos e jogos em 2024, o Palmeiras faturou R$ 40,5 milhões, sem contar a bilheteria de partidas, que é totalmente do clube. O total das receitas chegou a R$ 241 milhões.

Flamengo e Maracanã são outro caso bem-sucedido. Embora o clube carioca tenha planos para a construção de um estádio próprio, o faturamento com bilheteria tem batido recordes.

Apenas no primeiro turno do Brasileirão de 2025, o Flamengo lucrou R$ 19,6 milhões, já descontadas as despesas operacionais com as partidas. Em todo Brasileirão de 2024, o lucro foi de R$ 18,7 milhões.

O clube teve custos por partida reduzidos. Um dos motivos foi o aluguel ter se tornado mais barato, o que também vale para o Fluminense. O problema é que são os próprios clubes que administram a empresa que gere o estádio, reduzindo também o faturamento da companhia.

Além disso, o Flamengo fecha setores específicos em jogos considerados "de menor apelo". Isso torna a operação mais barata, mesmo que incomode alguns torcedores.

De modo geral, a "arenização" tem reflexos em preços de ingressos e público que frequenta as cadeiras (antes arquibancadas). A pesquisa "Gastos com Futebol", feita pelo Instituto Opinion Box, aponta que 61% dos brasileiros acredita que os eventos de futebol não são acessíveis para o público.

É o mesmo porcentual dos que disseram que participariam com mais frequência dos eventos se fossem mais baratos. O estudo foi feito em junho de 2025, ouviu 2.940 pessoas, de diferentes faixas etárias e regiões do Brasil, a pedido da Serasa.

O Palmeiras, buscando adequar-se também a essa realidade, implementou uma proposta antiga da gestão de Leila Pereira. No setor norte do estádio, a capacidade foi ampliada, com a chamada "Geral Norte", cujas entradas eram mais baratas.

O Grêmio, que teve sua arena comprada pelo empresário Marcelo Marques e passou a administrá-la integralmente, pôde reduzir os preços dos ingressos. Embora isso tenha fomentado públicos maiores, implica em redução de receita.

REGULARIDADE NÃO SE TRADUZ PÚBLICOS MAIORES

A Arena Pantanal tem 19 jogos em 2025 e tem regularidade nos últimos anos, já que o Cuiabá mantém o calendário entre as principais divisões do País. Isso não se converte em médias maiores.

A Arena Pernambuco vive situação semelhante, recebendo jogos do Retrô. O time está na Série C e, neste ano, disputou a Copa do Brasil até as oitavas de final. O estádio, que fica em São Lourenço da Mata, a 20 km do Recife, tem média de público de 4.412 pessoas por jogo em 2025. Isso representa 9,5% da capacidade total (46.154).

Outros casos parecidos são os da Arena das Dunas (RN) e Arena da Amazônia (AM). Os dois, porém, não monopolizam os mandos de América-RN (Série D) e Amazonas (Série B). O clube potiguar utiliza, por vezes, a Arena América, com capacidade para 5 mil pessoas, enquanto os amazonenses também jogam no Estádio Municipal Carlos Zamith, que comporta até 6 mil torcedores - ambos bem menores que as arenas.

EM BRASÍLIA, UM GIGANTE FORA DA CURVA

O Estádio Mané Garrincha recebeu, na Copa de 2014, oito jogos. São apenas três a menos que as 11 partidas em 2025. O local é usado como alternativa para vendas de mandos. Também foi o caso de dois clássicos em que o Vasco teve São Januário vetado pelos órgãos de segurança do Rio (contra Fluminense e Botafogo).

A média de público de 2025 é 22.844 - 31,38% da capacidade de 72.788. Há, contudo, um evento fora da curva, que eleva a média total. Em 20 de março, o Brasil venceu a Colômbia por 2 a 1, com a presença de 70.027 pessoas.

Excluindo essa partida, os outros 10 públicos do estádio em 2025 variam de 9.803 a 31.468. A média somente destes jogos é de 14.979 - 7.865 a menos que a média com a partida da seleção brasileira. Ainda considerando este número, o número destoa de estádios com calendários regulares, como Pantanal, Pernambuco, Dunas e Amazônia.

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